Crónica de Opinião: Toda a moeda tem duas faces

Depois do mortífero terramoto de Sendai, em 11/03/2011, que matou cerca de 20.000 pessoas, o The Guardian considerou a economia japonesa em queda livre e o Banco Mundial avaliou os danos em 235.000 milhões de dólares. No mesmo dia do sismo, o economista dos Estados Unidos, Larry Summers, baseado na ideia de que todo o desastre tem um lado positivo, pelo menos para o PIB, afirmou que, embora pudesse parecer paradoxal, a tragédia iria ser benéfica para a recuperação da economia do Japão.

É claro que poderia agora perorar sobre as duas faces da moeda aportando, inclusive, o título de um ensaio do filósofo francês Frédéric Bastiat, “ce qu’on voit et ce qu’on voit pas”. Mas como a receção de um texto depende, também, da janela do recetor, entenda-se, das (in)formações e dos (des)interesses pontuais do leitor, vou quedar-me pelo primeiro membro da frase, “ce qu’on voit”.

Em vários autores ou em várias culturas, podemos ler este provérbio japonês, talvez escrito de forma diferente, mas apontando o mesmo caminho, “se caíres sete vezes levanta-te oito”. Com efeito, e citando pela milésima vez o verso do poeta espanhol que nos avisa que “se hace camino al andar”, tropeçar num pedregulho do nosso percurso ou cair na bocarra de uma depressão não será drama se logo logo nos levantarmos. Aliás, transformar o acidente em desafio é desenhar, com a sageza da vida, a segurança do nosso percurso futuro; é analisarmos, com eficiência, o “ce qu’on voit” para, com eficácia, caminharmos para o “ce qu’on voit pas”.

Vem esta leve reflexão a propósito do momento pandémico que ainda vivemos, e provavelmente não nos abandonará tão cedo, mas que nos ensinou que toda a encruzilhada nos aponta, no mínimo, dois caminhos.

Na passada semana, tivemos (eu e minha família) o agradável prazer de receber em Viana, e em nossa casa, Vera Canto Bertagnoli, Past-Governadora (do Distrito Rotário Brasileiro 4720) de Rotary International, e membros da sua família.

Levamo-los a visitar partes do nosso Alto Minho e espaços icónico-totémicos desta Viana do Letes. Ficaram encantados e com uma vontade imensa de aqui viverem, “aquando da sua aposentadoria”.

Na passada quinta-feira, o Rotary Club de Viana organizou, um pouco em cima da hora pois tudo assim aconteceu, um jantar de despedida numa das quintas das redondezas. Entre rotários de Viana, Valença, Monção, Caminha, Arcos de Valdevez, Braga e Esposende, éramos 52. Findo o jantar, estive “à conversa com Vera Bertagnoli” sobre vários temas rotários, com transmissão direta para as redes sociais (caminho que o confinamento nos apontou) onde nos acompanharam mais de duas centenas de portugueses e brasileiros.

Não fora a pandemia e esta conversa com a Vera Bertagnoli teria ficado circunscrita a 52 ouvintes. Contudo, o covid 19 lembrou-nos que se Maomé não sobe à montanha desce esta até Maomé.

A pandemia foi o nosso último tsunami social, mas forçou-nos a usarmos uma das vias da encruzilhada e, novos e velhos, “desatamos” a utilizar mais as redes sociais e não paramos de comunicar ainda que, e sempre, sadiamente nos sintamos saudosos de um bom jantar entre amigos, uma eficaz reunião presencial.

Este tsunami mostrou-nos as duas faces da moeda: umas vezes estamos juntos, olhamo-nos, cheiramo-nos, tocamo-nos, discutimos, trabalhamos; outras estamos “online” e assim permitimos que alguns amigos mais velhos ou em viagem possam também participar na vida das nossas associações, das nossas famílias, das nossas amizades.

Saibamos nós ler, com propósito e parcimónia, as propostas desta encruzilhada pois, atentos ou não, toda a moeda tem duas faces!

Meadela, 23/10/21

José Luís Carvalhido da Ponte